Sefarditas é uma expressão usada para se referir aos descendentes de judeus originários de Portugal e Espanha. A palavra originou-se da denominação hebraica para denominar a Península Ibérica (Sefarad, ספרד), já a palavra Sefarditas significa em hebraico ספרדים, sefaradi; e no plural, sefaradim).
Esse povo, muito provavelmente, se estabeleceu na Península Ibérica durante a era das navegações fenícias, certamente depois das destruições do Templo de Jerusalém, embora a sua presença só possa ser confirmada a partir do Império Romano. Esses judeus conseguiram sobreviver à imposição do cristianismo, invasão visigótica e moura, mas sucumbiram na conquista do Brasil, devido a inquisição que seu povo sofreu, quando ocorreu o casamento entre a família real portuguesa e espanhola.
O povo judeu se instalou no território que mais tarde veio se tornar Portugal, a partir desse período. Antes disso, os judeus chegaram à Península Ibérica como comerciantes ou como fugitivos das perseguições contra eles, promovidas, muito provavelmente na época do rei Salomão, durante o século III.
O mais antigo documento escrito relativo aos judeus na Península Ibérica data do século VI, sendo considerado o documento mais antigo que fala desse povo. Nos tempos do reino visigodo, a situação dos judeus foi instável, uma vez que havia a necessidade do seu dinheiro para bancar respectivo o rei, o que o levava a aceitá-los em seu reino.
Certo, porém, que haviam os reis que protegeram os judeus como também aqueles que os perseguiram sem qualquer intenção religiosa. Com a invasão dos árabes na Península Ibérica, a situação ficou mais favorável ao povo judeu, o que veio acompanhado com o crescimento da cultura judaica uma vez que a circunstância antijudaica em curso no resto da Europa por causa do Cristianismo não existia no reinado muçulmano. Os judeus foram protegidos pelos califas peninsulares e até exerceram funções importantes no governo portuguesa, e em todo o governo.
Após a expulsão muçulmana, e durante a formação de nacionalidade portuguesa os judeus começaram a viver entre os cristãos, dividindo o mesmo espaço, por exemplo, em várias cidades portuguesas como Coimbra, Lisboa ou em Santarém, local onde se encontra a mais antiga sinagoga do país lusitano.
O número dos judeus aumentava e era incentivado pelos primeiros reis portugueses (D. Afonso Henriques, D. Sancho I.) por necessidade, para conter e cobrir as áreas conquistadas pelos Mouros. Estes judeus, estabelecidos e oriundos do Mediterrâneo, sobretudo, na Espanha e em Portugal, como também Itália, Grécia, Turquia entre os outros foram chamados de Sefarditas (sefaradim) – distinguindo-se de outros judeus com origens diversas, os asquenazitas (ashkenazim), que se estabeleceram na França e na Alemanha onde mais vieram a se expandir para a Europa Central e Rússia.
Durante os séculos XIV e XV os judeus sefarditas tiveram importantes posições na sociedade portuguesa e muito contribuíram para ela; eles ocupam vários cargos económicos e sociais, o que os ajudou a aprofundar e a estreitar laços com a maioria do povo cristão do país. As duas religiões tão singulares conseguiram viver sem grande ódio e fanatismo em Portugal, o que não acontecia em outras partes da da Península Ibérica e restante da Europa, nesse tempo.
Foram 2 mil anos de coexistência nos quais a marca da presença judaica enraizou e influenciou na cultura, na língua e mesmo nos costumes portugueses. Por exemplo, chamamos azeitona ao fruto da oliveira, chuva o regresso das águas e a lavagem e limpeza das nossas roupas. Fácil perceber a influência judaica nessas palavras pois em hebraico oliveira é hazeit, e o regresso das aguas shuv. Contudo, a cultura judaica na Península Ibérica vai muito além das palavras e são muito mais profundas, como nos nomes e sobrenomes, e até mesmo em nosso DNA, como pode ser notado nos dias de hoje.
Quando Dom Manuel I ascendeu ao trono português, em 1495, e o anúncio do seu casamento com a princesa Isabel da Espanha a situação dos judeus em Portugal sofreu um forte impacto e foi drasticamente alterada. O contrato de casamento incluía uma cláusula que exigia a expulsão dos hereges (mouros e judeus) do território português. Apesar do rei ter tentado fazer com que a princesa reconsiderasse pois via com bons olhos o dinheiro e o conhecimento técnico dos judeus para o seu projeto de desenvolvimento de Portugal, não conseguiu.
Em 5 de Dezembro de 1496, Dom Manuel I assina o decreto de expulsão dos hereges, concedendo-lhes prazo até 31/10/1497 para que optassem pela conversão ou desterro. D. Manuel I esperava que muitos deles se batizassem e se convertessem a fé cristã, ainda que apenas superficialmente. O que não ocorreu, a grande maioria do povo judeu optou por abandonar o país e a partir de 1506 inicia-se uma nova diáspora judaica. Muitos foram para o norte da Europa , sobretudo Holanda e Alemanha, outros para o sul da França, nas regiões de Bordéus, Biarritz, Tartas e outras, já outros, foram para a Inglaterra.
Em outra oportunidade falaremos sobre os judeus espanhóis e sua expulsão da Espanha, não sendo o objetivo deste texto.
Alguns judeus retornaram ao Oriente Médio, tendo sido recebidos pelos turcos otomanos . E outros vieram para o “novo mundo”, deslocando-se para Pernambuco, que na época entava sob domínio holandês. E de lá para várias regiões do Nordeste brasileiro, fundando no Recife a primeira sinagoga das Américas, a Sinagoga Kahal Zur Israel, sob a direção de Hakham Isaac Aboab da Fonseca.
Com a reconquista portuguesa do Nordeste do Brasil, e a proibição de praticar o judaísmo, a comunidade judaica dispersou-se, sendo que alguns voltaram para Amsterdam, e outros migraram para outras colónias holandesas nas Américas do Sul, Central e do Norte. Contudo, uma parcela desse povo permaneceu e decidiu enfrentar a coroa portuguesa, refugiando-se nos sertões do interior do Nordeste Brasileiro onde se converteram em cripto-judeus.
A inquisição portuguesa perseguiu, prendeu, torturou e matou diversos judeus em território brasileiro, sendo que muitos foram levados de volta à Portugal para serem julgados pela inquisição. As últimas informações sobre a presença de judeus ibéricos no Brasil datam de meados do século XVIII. Mesma época, em que começou o desenvolvimento da mineração na colónia, o que levou milhares de portugueses a se deslocaram para a região de Minas Gerais, grande produtora de ouro e pedras preciosas, como diamantes e esmeraldas, Dentre esses portugueses um número considerável de cristãos-novos também se deslocou para essa região.
Vindo a se espalharem por todo território brasileiro, posteriormente, sendo por este motivo que muitos historiadores e escritores afirmam que grande parte da população brasileira é descendente de judeu cerca de 1/3, e que portanto, mesmo passado tantos anos, possuem ligação com esse povo.
Como reparação histórica pelo sofrimento desse povo promovido pelo rei Português, em 29 de julho de 2013, o Parlamento Português aprovou a Lei Orgânica n° 1/2013, a qual tentava corrigir os danos causados por esse enorme erro, estabelecendo a possibilidade de atribuição de nacionalidade portuguesa a descendentes dos judeus sefarditas que foram expulsos de Portugal a partir do século XV. Sendo que no dia 02 de março de 2015, entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 30-a/2015, de 27 de Fevereiro, legitimando essa possibilidade. No entanto, no dia 18 de março de 2022, o governo português alterou o processo de nacionalidade, o que afetou diretamente os sefarditas, pois passou a se exigir vínculo com Portugal para que seja concedida a Naturalização Portuguesa por essa via.
Refere-se a uma aquisição de nacionalidade derivada por naturalização aos cidadãos estrangeiros, descendentes de judeus sefarditas que demonstrem ter origem ou a pertencer a uma comunidade judaica sefardita de origem portuguesa, com base em requisitos objectivos e comprovados, através de estudos genealógicos, comprovações feitas por rabinos reconhecidos e certificados emitidos pelas Comunidades Israelitas de Portugal, Comunidade Israelita de Lisboa, CIL, e a Comunidade Israelita do Porto, CIP. Como, também, um processo a ser realizado em uma Conservatória portuguesa, que precisa ser aprovado pelo Ministro da Justiça português.
* Rodrigo da Costa é jornalista, advogado e especialista em Direito Internacional e Humanos.